O Conselho de Ética, Eduardo Bolsonaro e o paradoxo da Câmara: posar de cueca é mais grave do que lesar a Pátria

Edmundo Barreto Pinto e a famosa foto de cueca; o trio que prejudica o Brasil (Foto: O Cruzeiro | Divulgação)
Deputado já foi cassado por foto ingênua, fruto de armação. Já o atual guardião da ética na Câmara considera normal parlamentar agir contra a soberania do País
Joaquim de Carvalho
brasil247.com/
A declaração recente do presidente do Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, Fabio Schiochet (União Brasil-SC), de que o deputado Eduardo Bolsonaro “não quebrou o decoro” ao faltar a sessões para realizar lobby nos Estados Unidos contra ministros do Supremo Tribunal Federal e contra o próprio Brasil, revela um contraste histórico perturbador.
Em 1949, o primeiro deputado a sofrer cassação no Brasil foi Edmundo Barreto Pinto, do PTB de Getúlio Vargas. Seu “crime”: ter posado de cueca para a revista O Cruzeiro, após ser ludibriado pelo jornalista Davi Nasser e pelo fotógrafo Jean Manzon.
A foto, mais do que um episódio pitoresco, foi pretexto para que setores conservadores do Congresso, adversários do varguismo, movessem uma campanha contra o PTB. O argumento jurídico usado à época foi a quebra do decoro parlamentar.
Setenta e cinco anos depois, o atual presidente do Conselho de Ética trata como perfeitamente aceitável um deputado federal viajar ao exterior para pedir sanções contra o próprio país, buscar anistia para o pai processado por tentativa de golpe de Estado e colaborar com forças políticas estrangeiras que visam enfraquecer a soberania nacional.
O episódio custou caro: o governo brasileiro foi obrigado a mobilizar R$ 40 bilhões para evitar que empresas atingidas pelo tarifaço de Donald Trump quebrassem ou demitissem em massa.
O contraste é gritante: posar de cueca em uma revista foi considerado mais grave do que conspirar contra as instituições brasileiras em território estrangeiro. A mensagem transmitida pela Câmara é que a moralidade parlamentar se mede mais pela aparência do que pela substância.
Mais do que isso: o Congresso blinda alguns parlamentares por conveniência política ou outros interesses. Indicado por Hugo Motta para presidir o Conselho de Ética, Schiochet é de um Estado onde o avanço da extrema direita se tornou muito preocupante.
Também deve ser levado em consideração a informação de bastidor de que Hugo Motta teria o compromisso com o PL de não cassar Eduardo Bolsonaro. O próprio presidente do Conselho de Ética disse, na mesma entrevista, que o deputado que faz lobby contra o Brasil nos EUA perderia o mandato por excesso de faltas.
Nesse caso, seria um ganho para Eduardo Bolsonaro, já que ele não perderia o direito de se candidatar a deputado ou até senador em 2026, mesmo residindo no Estado do Texas.
É uma vergonha para o Parlamento brasileiro deixar de punir quem lesa a pátria. E, pelo antecedente histórico, considerar ultrajante um deputado se deixar fotografar, ingenuamente, vítima de uma armação, como conta o jornalista Carlos Chagas em seu livro O Brasil sem Retoques.
Se, no passado, Barreto Pinto foi vítima de um julgamento político travestido de defesa da honra da instituição, no presente Eduardo Bolsonaro se beneficia de um julgamento político no sentido inverso: a leniência travestida de normalidade.
O Conselho de Ética demonstra que a régua do decoro não é estável nem republicana, mas moldada pelas conveniências e pelas forças políticas de cada época.
A história, assim, revela um paradoxo: no Brasil, posar de cueca pode ser mais indecoroso do que atentar contra a soberania de um país inteiro.
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